ESTRUTURA
Parte I
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POEMAS (44)
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I Os Campos
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Os castelos
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O das quina
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II Os Castelos
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1) Ulisses
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2) Viriato
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3) O conde D. Henrique
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4) D. Tareja
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5) D. Afonso Henriques
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6) D. Dinis
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7 a) D. João, o primeiro
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7 b) D. Filipa de Lencastre
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III As Quinas
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D. Duarte, rei de Portugal
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D. Fernando, infante de Portugal
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D. Pedro, regente de Portugal
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D. João, infante de Portugal
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D. Sebastião, rei de Portugal
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IV A Coroa
V
O Timbre |
Nunálvares Pereira
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A cabeça do grifo / O infante D. Henrique
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Uma asa do grifo / D. João, o segundo
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A outra asa do grifo / Afonso de Albuquerque
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PARTE 2
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O Infante
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Horizonte
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Padrão
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O mostrengo
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Epitáfio de Bartolomeu Dias
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Os colombos
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Ocidente
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Fernão de Magalhães
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Ascensão de Vasco da Gama
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A última nau
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Mar Português
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Prece
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Par PARTE 3
O ENCOBERTO
Pax in excelsis
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I Os Símbolos
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D. Sebastião
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O Quinto Império
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O Desejado
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As Ilhas Afortunadas
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O Encoberto
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II Os Avisos
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O Bandarra
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António Vieira
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Terceiro
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III Os Tempos
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Noite
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Tormenta
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Calma
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Antemanhã
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Nevoeiro
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...para informação
MENSAGEM
Fernando Pessoa tinha a intenção de publicar uma colectânea de poemas de índole patriótica (no sentido particular e universal que Pessoa dá a este termo). Numa carta escrita em Janeiro de 1915 a Armando Côrtes Rodrigues, diz: «a ideia patriótica, sempre mais ou menos presente nos meus propósitos, avulta agora em mim; e não penso fazer arte que não medite fazê-lo para erguer alto o nome português através do que eu consiga realizar. É uma consequência de encarar a sério a arte e a vida». Numa carta a Casais Monteiro, Pessoa define-se como um «nacionalista místico, um sebastianista racional» Com efeito, já em 1912 profetizava o aparecimento de um super-Portugal e de um super-Camões. Tal atitude produziu, além do poema «À memória do Presidente-Rei Sidónio Pais», a Mensagem (1934) primeiro e único livro publicado em vida do autor. Como epígrafe, Pessoa antepôs a frase latina «Benedictus Dominus Deus noster qui dedit nobis signum» - esta citação introduz-nos inteiramente no plano dos símbolos. A obra é uma colectânea de poesias, em geral, breves, concisas, compostas em épocas diferentes, tendo, no entanto, unidade de inspiração: sopro patriótico de exaltação e incitamento e um certo equilíbrio arquitéctonico. O livro está dividido em três partes:
1ª--O Brasão (engloba os Campos, os Castelos, a Coroa, as Quinas, o Timbre) - nele desfilam heróis lendários e históricos, desde Ulisses a D. Sebastião.
2ª -- Mar Português - com poesias inspiradas na ânsia do desconhecido e no esforço heróico de luta contra o Mar.
3ª--O Encoberto - (engloba os Símbolos, os Avisos e os Tempos) - onde se afirma um sebastianismo de apelo e certeza profética «Tudo é incerto e derradeiro/ Tudo é disperso nada é inteiro/ Ó Portugal, hoje és nevoeiro... / É a Hora !».
A poesia de a Mensagem é uma poesia épica «sui generis», épico-lírica, não só pela forma fragmentária, como pela atitude introspectiva, de contemplação no espelho da alma e pelo tom menor adequado. Só raras vezes, o poeta se serve da « tuba canora » da épica tradicional (O Mostrengo) ou lembra com comoção as dores reais da nossa História Trágico-Marítima (Mar Português). Dum modo geral, interioriza, mentaliza a matéria épica, integrando-a na corrente subjectiva, reduzindo essa matéria a imagens simbólicas pelas quais o poeta lírico se exprime. Há, na Mensagem, uma dupla face de tédio e ansiedade, de céptica lucidez e intuição divinatória. Glosando a ideia da predestinação nacional (Deus age pelo braço dos heróis), Pessoa impregna de idealismo platónico a sua visão do acontecer histórico: não é tanto o Império terreno que ele canta, mas sim a ideia condutora, o que não existe no mundo sensível, a quimera, o mito, a fonte do impossível , a loucura «Sem loucura que é o homem / Mais que a besta sadia / Cadáver adiado que procria ?»
Aliás, já em 1912 escrevera «E a nossa Grande Raça partirá em busca de uma Índia Nova, que não existe no espaço, em naus que são constituídas daquilo que os sonhos são feitos. E o seu verdadeiro e supremo destino, de que a obra dos navegadores foi o obscuro e carnal ante-remedo , realizar-se-á divinamente».
Com efeito, na Mensagem expressou poeticamente os mitos que os Descobrimentos tinham expressado sob a forma de acção. Através de uma transmutação do real, o poeta tentou captar, desde os primórdios da pátria, a sua identidade, o seu ser eterno, aquele que emerge e subsiste, incólume ao tempo, ao devir. Esta transformação não implicará um propósito ou uma visão historicista; pelo contrário, toda a Mensagem possui valor simbólico e mitológico. A realidade nela contida e contada situa-se para além das coordenadas do tempo e possui uma perene actualidade que não vive na história, mas num outro plano - um plano, onde a cronologia não é deste tempo, do mundo real e fenomenal, mas como que pertence ao mundo e tempo da alma. Aí, todos os reais antepassados, fundadores e heróis, evoluem numa paisagem que já não é deste mundo e as suas figuras e feitos possuem um recorte e erguem-se num halo de eternidade. Existe, assim, a transfiguração das personagens históricas em mitos e a transcrição transfigurada da história de uma nação. Foi o ser eterno, «a vida verdadeira » da pátria, situado, para além do espaço e do tempo, que o poeta cantou na sua poesia.
A Mensagem surge, assim, como um mito e um rito que conta a criação de uma pátria. O 1º deles, Ulisses, não pertence à realidade deste tempo e espaço «Este, que aqui aportou / Foi por não ser existindo./ Sem existir nos bastou. / Por não ter vindo foi vindo / E nos criou. ». Também o desastre de Alcácer Quibir não se situará na realidade do tempo profano, não pertencerá totalmente à história, mas marcará o fim desse mundo por um cataclismo mítico: será a água - elemento cósmico, purificador, por excelência - que encerrará esse ciclo: «A derrota ficou: como uma cheia / Do mal cobriu os vagos batalhões (...) Água que mão infiel verteu na areia ». Este fim iniciará um novo ciclo - a vinda apocalíptica de D. Sebastião, o grande Regenerador: «E em mim, um mar que não tem tempo ou spaço, / Vejo entre a cerração teu vulto baço / que torna (...)».
In Jacinto do Prado Coelho , Dicionário de Literatura
Dalila L. Pereira da Costa , O esoterismo de Fernando Pessoa (adaptado)