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Dedicatória


Glossário:
Vós – refere-se a D. Sebastião; segurança: penhor da independência de Portugal; maura lança: exércitos mouros. Fatal: determinado pelo Destino; idade: tempo, época. superno: superior, supremo. Rodamonte: deformação de Rodomonte, personagem do poeta italiano Boiardo em Orlando Innamorato (séc. XV); Rugeiro: Ruggiero, personagem de Orlando Furioso, de Ariosto (poeta italiano, séc. XVI). Orlando: Roland, herói de Chanson de Roland séc. XI).

1- Camões dedica o poema ao rei D. Sebastião, a quem louva pelo que representa para a independência de Portugal e para o aumento do mundo cristão; pela ilustre e cristianíssima ascendência e ainda pelo grandioso Império de que é senhor.
- Aos louvores, segue-se o apelo.
Referindo-se com modéstia à sua obra, que designa como “um pregão do ninho (...) paterno”, pede ao Rei que a leia. Na breve exposição que faz do assunto d’Os Lusíadas, o poeta evidencia o valor de feitos e heróis; a obra não versará sobre heróis lendários e fantasiosos; valoriza os heróis nacionais pelo confronto com os de outras epopeias.
-Camões termina o seu discurso incitando o Rei a dar continuidade aos feitos gloriosos dos portugueses, nomeadamente, combatendo os mouros, e renovando o pedido para que leia os seus versos.

O tempo em que Camões escreve Os Lusíadas é já um tempo de decadência nacional, pós-descobrimentos, o que explica o tom apelativo do seu discurso.
O discurso da Dedicatória organiza-se obdecendo a — louvor, apelo de carácter pessoal e argumentos que o fundamentam, incitamento/apelo de carácter nacional e, em jeito de conclusão, breve reforço do apelo pessoal.
2-A Dedicatória apresenta uma estrutura própria do género oratório:
·         exórdio, que corresponde ao início do discurso (6 a 8);
·         exposição ou corpo do discurso (9 a 11);
·         confirmação, em que seriam apresentados exemplos e ou argumentos (12 a 14)
·         epílogo ou conclusão (15 a 17).


De salientar a utilização da segunda pessoa do plural (“vós”), do modo imperativo (“Ouvi”) e de numerosas apóstrofes (“ó bem nascida segurança” - também perífrase)  características da oratória.
No exórdio (6), o poeta dirige-se D. Sebastião considerando-o o enviado providencial para assegurar a independência de Portugal, continuando a obra da dilatação da fé e do império. O vocativo «vós»  desdobra-se em múltiplos elogios: D. Sebastião é-nos apresentado como defensor nato da liberdade da Nação, como o continuador da dilatação da Fé e do Império, como o Rei temido pelo Infiel, como o homem certo no tempo certo, «dado ao mundo por Deus».
Na exposição (10, 11), o poeta pede a D. Sebastião que ponha os olhos no poema que desinteressadamente fez e lhe dedica, no qual ele verá os grandes feitos dos portugueses, reais e não fingidos, maiores do que os narrados nas antigas epopeias, de tal forma que o jovem rei se poderia julgar mais feliz como rei de tal gente do que como rei do mundo todo (hipérbole).
O poeta salienta que o moveu o «amor da pátria» e não a busca de “prémio vil”.
Sinónimos para falsas proezas: vãs façanhas, fantásticas, fingidas, mentirosas, sonhadas, fabulosas. Tudo isto é suplantado pelas proezas «verdadeiras» dos Portugueses. Uma hipérbole que os últimos dois versos repetem.
O vocativo e o modo imperativo são as marcas mais notórias da função apelativa da linguagem. Vejamos, então, no texto, a frequência destas duas marcas: “E vós, ó bem nascida segurança...”, “ó novo temor da maura lança...” “Ouvi…” “Ouvi...”.
Os Lusíadas são fonte de glória para Camões pode ver-se nos quatro primeiros versos da estrofe 10, em que o poeta afirma que foi levado a escrever o seu poema, não pelo desejo de um prémio vil (material), mas de um prémio alto e quase eterno. Esse prémio é a fama de grande poeta entre os portugueses (ser conhecido por um pregão do ninho meu paterno).
O poeta exalta D. Sebastião como jovem rei destinado pelo Fado, ou pela Providência, a grandes feitos, num império já imenso, mas que ele acrescentaria ainda, dilatando a fé e o império (“para do mundo a Deus dar parte grande”).
O louvor de D. Sebastião está pois, em ser apresentado como um jovem rei de quem o povo português tudo espera, rei que a providência faz surgir para retomar a grandeza dos feitos portugueses. A ideia do jovem rei como salvador da pátria reflecte a crise em que a nação já se encontrava e tão arreigada estava no povo que nem com a morte do rei desapareceu. O sebastianismo corresponde à imagem de um rei fatalmente destinado a ser salvador de uma nação em crise.